segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O Par de Botas.


Nós, que um dia fomos alegria, somos agora tristeza...
Nós que um dia fomos o início, agora somos o fim.
Lembramo-nos bem do momento em que nos unimos;
Nós a você.

Uma nova vida se descortinava... Exercias uma profissão! ...
Quando tu te tornaste um mágico a construir o teto de mundos alheios,
Edificando lares, que mal sabias tu que eram sonhos!

Nós estávamos contigo a cada passo, a cada subida, a cada descida...
No pesar do calçar e no prazer do descalçar.
Testemunhamos teu cansaço, teu renovar de forças e tua luta diária...
Te ajudamos como pudemos... Te demos todo o conforto e proteção que podíamos...
Mas nossa vida chega ao fim... E a tua continua.
Mesmo cansado e já estropiado como nós, a tua continua.

E se renova... Tu tens um legado que te ama, conforta e alegra muito mais do que nós nunca pudemos.
Tu tens uma nova vida, na tua vida.
Acabou-se uma e começa outra.

Nós não. Somos agora apenas a lembrança do que fostes,
já não somos parte do teu agora.
Vez ou outra tu te lembrará de nós, ora com saudade, ora com o alívio do fim, ora com orgulho...
O orgulho.
Esse é nosso resquício em tua nova vida... Com ele tu te lembrará que sois quem sois também por nós... Te ajudamos a chegar até aqui.

Mas o agora não tem espaço para um par de botas. Botas de operário.
Somos tristeza pelo fim de nossa vida e pela saudade de nossa importância para ti.
Morremos com o orgulho do que vivemos juntos... felizes pela tua nova vida.

Nós, que fomos um dia alegria, somos agora saudade.

(Ísis. - em agosto de 2010)



*a gravura é obra de Vincent Van Gogh - "O Par de Botas", e o texto foi feito a partir dela para um trabalho da faculdade.)

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